segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

HOMILIA NA MISSA DA NOITE DO NATAL
(Catedral de Uruguaiana, 24/12/2013)
 
Com espírito de fraternidade, tão próprio do clima natalino, saúdo todos como Irmãos e Irmãs, desejando Feliz e Santo Natal.Ao preparar a homilia do Natal deste ano de 2013, senti grande apelo do Espírito do Senhor e seu santo modo de operar para escrevê-la, tendo em vista a grande importância e o profundo significado do Mistério da Encarnação: do Verbo, da “Palavra que se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1, 14). Em recente documento o Papa Francisco afirma que “o pregador tem a belíssima e difícil missão de unir os corações que se amam: o do Senhor e os do seu povo” (Evangelii Gaudium 143), tornando-se intermediário desse diálogo, que depois continua entre os dois...Para retomarmos a importância do mistério que celebramos nesta noite santa, citamos São Francisco que,em 1223,idealizou e realizou, em Greggio – Itália, o primeiro presépio, para representar vivamente o que acontecera em Belém. O Santo de Assis define o Natal do Menino Jesus como “a festa das festas” e por isso a celebrava “com inefável alegria, mais do que as outras solenidades” (2Cel 199, 1), afirma o seu biógrafo.Como o anjo, na noite do nascimento de Jesus, também nós podemos proclamar solenemente na Liturgia desta noite santa: “Não tenhais medo! Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo povo; hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor!” (Lc2, 11-12). É por isso que a oração das oferendas desta celebração afirma: “Acolhei, ó Deus, a oferenda da festa de hoje, na qual o céu e a terra trocam os seus dons”. Verdadeiramente, o ‘sim’ de Maria realizou o encontro desejado por Deus, desde toda eternidade:possibilitou que Deus Pai nos desse, pelo Espírito, o melhor de si, o seu Filho Jesus Cristo. Em troca, Maria e José, representando a humanidade, lhe deram seu bem mais precioso: o coração, a fé, a acolhida da graça. “Desde aquele instante em que a Palavra se fez carne, o céu é também terra e a terra já está no céu!” (Pe Antônio José de Almeida, in O Pão Nosso de Cada Dia, n. 96, p. 61). Nossa história se tornou também história de Deus, pois o divino então entrou em nosso tempo, fez-se EmanuelDeus-conosco (Is 7, 14; Mt 1, 23). Por isso a oração das oferendas, citada acima, continua emsúplica: “... dai-nos participar da divindade daquele que uniu a vós a nossa humanidade” (Oração das Oferendas – Missa da Noite do Natal).Este Menino, diante do qual se divide a história da humanidade, em antes e depois, é celebradona Liturgia deste tempo do Natal como nova luz que brilhou para nós, como ouvimos há pouco na leitura da Palavra de Deus, vencendo as trevas do pecado. Na linguagem da Sagrada Escritura Ele é a luz que brilha nas trevas (Is 9, 1); nasce como o sol da justiça (Mal 3, 20); é o sol nascente que nos vem visitar (Lc 1, 78), é a Luz do mundo, quem o segue não anda nas trevas (Jo 8, 12). Os cristãos, ao iniciarem a celebração do Natal do Senhor, como festa litúrgica (séc. IV), logo a relacionaram com o solstício do inverno europeu e asiático, onde iniciou o Ano Litúrgico da Igreja: o Senhor é oSol invencível (SolisInvicti), Aquele que vence as trevas do pecado. Por isso, deixemo-nos iluminar e transformar por essa Luz, também em nosso tempo, quando as luzes brilham por todos os lados: em nossas casas e igrejas, nas ruas e praças, e nos locais mais diversificados de nossos ambientes de vida. Como dizia São Paulo, na segunda leitura de hoje: “Ele se entregou por nós, para nos resgatar de toda maldade e purificar para si um povo que lhe pertença e que se dedique a praticar o bem” (Tt 2, 14), vivendo neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade. Caros Irmãos,queridas Irmãs!A liturgia desta noite santa anuncia ainda outra grande Boa nova: no momento em que o Filho de Deus assume a nossa fragilidade, “a natureza humana recebe uma incomparável dignidade: ao tornar-se ele um de nós, nós nos tornamos eternos” (Prefácio III do Natal do Senhor), abrindo-nos as portas da eternidade, rompendo os limites que o pecado nos impunha. Pela encarnação de seu Filho, o Pai nos quer Filhos e Filhas, participantes de sua vida divina. Eis o que nos faz cantar: “Noite Feliz! Noite Santa! Noite de Luz!”. Pois Deus ultrapassa todos os limites humanos imagináveis com sua misericórdia para encontrar-se conosco, para estar conosco, para viver conosco, para tornar-nos também eternos.Mas todo esse Seu amor, toda Sua misericórdia, querendo-nos filhos e filhas, salvos e participantes de sua vida, precisam ser acolhidos por nós, com nossa resposta de fé. Por isso, não podemos somente comemorar mais um aniversário de Jesus, deixando-o dois mil anos atrás, num passado distante, fazendo festas à suas custas, sem envolver-nos com Ele, sem encontrar-nos com Ele, sem abrigá-Lo em nossa vida. Muito mais que lembrar os fatos da gruta de Belém, nós queremos ser os personagens que ela abriga e acolhe. Hoje chegou a nossa vez e nosso tempo de ser Maria, José, as famílias de Belém, os pastores, os anjos, os magos... Ou queremos ser como as famílias que não tiveram lugar para Ele? Ou talvez como Herodes, que deseja ver o Menino longe e até matá-Lo? Sim,podemos ser como José e Maria, acolhendo em nosso tempo o plano de Deus na fé, amando e defendendo os valores da Vida, da família, como a sagrada Família de Nazaré; somos enviados em nosso tempo quais anjos que anunciam, como discípulos missionários, a Boa Nova da Salvação, trazida por Jesus Cristo; somos convidados a sermos quais pastores que acolhem a Boa Notícia e acorrem prontamente para buscar o encontro com Jesus, vivendo a partir de sua presença, anunciando-a com alegria; somos desafiados a seguir a Estrela, quais Magos que procuram compreender o sentido dos sinais de Deus na história, para encontrá-Lo e oferecer-Lhe o que de mais precioso temos em nossa vida...Por isso, Irmãos e Irmãs, nós cristãos, não podemos contentar-nos com um Natal festivo e de bem-estar, comosimples e descomprometido aniversário de Jesus e, muito menos,considerar-nos satisfeitos com míticas histórias de Papai Noel. O mistério do Natal deve tornar-se hoje, portanto, vivo entre nós. À medida que nosso modo de ser e de agir se aproximarem da Boa Nova de Jesus; quandonossas atitudes se expressarem no amore na fraternidade, na justiça e na paz, no perdão e na misericórdia, na acolhida dos outros, sobretudo dos que vivem nas periferias existenciais, como fala o Papa Francisco, sempre será Natal, pois Deus estará renascendo de alguma forma entre nós e através de nós, fazendo acontecer o Seu Reino, no hoje de nossa história.Que o verdadeiro presépio seja nosso coração, nossa vida, nossa família, nossa comunidade. Seja este presépio o ambiente onde Deus pode estar conosco, como o hóspede mais nobre da nossa vida. Como narra o biógrafo de São Francisco de Assis, na noite de Natal, em que o santo encenou o primeiro presépio: “O Menino Jesus, que tinha sido relegado ao esquecimento (Sl 30,13) nos corações de muitos, reviveu pela graça de Deus” (1Cel 86). Que este reviver de Deus em nós, seja o grande presente de Natal ou, quem sabe, o grande milagre do Natal de 2013. Assim seja!
Dom Aloísio A. Dilli - Bispo de Uruguaiana

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