sábado, 18 de outubro de 2014

Deus nos dá o céu como fiança da eternidade



Por Redacao
CIDADE DO VATICANO, 17 de Outubro de 2014 (Zenit.org
- Deus deu o céu aos cristãos, através do Espírito Santo, como "fiança" da eternidade, mas às vezes este dom fica obscurecido por uma vida "opaca" e hipócrita, afirmou o papa Francisco na homilia da missa desta manhã, na Casa Santa Marta.
O Espírito Santo é o "selo" de luz com que Deus nos deu "o céu nas mãos", afirmou o papa. Os cristãos, com frequência, escapam desta luz por uma vida de penumbra e, pior ainda, de luz fingida, que brilha na hipocrisia. A homilia de hoje segue, passo a passo, as palavras da leitura de Paulo, que explica aos cristãos de Éfeso que, por terem acreditado no evangelho, eles receberam "o selo do Espírito Santo".
Com este dom, Deus "não só nos escolheu" como nos deu um estilo, "um modo de viver, que não é somente uma lista de costumes, mas uma identidade".
Francisco explicou: "A nossa identidade é precisamente este selo, esta força do Espírito Santo, que todos nós recebemos no batismo. E o Espírito Santo selou o nosso coração e, mais ainda, caminha conosco. Este Espírito, que tinha sido prometido, não só nos dá a identidade como é, também, uma fiança da nossa herança. Com ele, o céu começa. Nós estamos vivendo este céu, esta eternidade, porque recebemos o selo do Espírito Santo, que é precisamente o início do céu: a fiança. Nós temos o céu na mão com este selo".
Ter como fiança de eternidade o próprio céu não impede os cristãos de resvalar ao menos em algumas tentações, alertou o papa. "Quando nós queremos, não digo cancelar, mas podemos tornar opaca a nossa identidade". É o caso, disse o papa, do "cristão morno. Ele é cristão, sim, vai à missa aos domingos, sim, mas, na sua vida, a identidade não é visível. Ele vive como um pagão: pode viver como um pagão, mas é cristão. Ser mornos. Tornar opaca a nossa identidade. E o outro pecado de que Jesus fala aos seus discípulos e que nós escutamos: ‘Guardai-vos bem da levedura dos fariseus, que é a hipocrisia’. Fingir: finjo ser cristão, mas não sou. Não sou transparente; digo uma coisa, mas faço outra coisa que não é cristã".
O próprio Paulo recorda, em outra passagem, que uma vida cristã vivida conforme a identidade criada pelo Espírito Santo traz como presente grandes dons, disse o pontífice.
Para encerrar a reflexão da homilia, o Santo Padre destacou: "Amor, alegria, paz, magnanimidade, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio de si: este é o nosso caminho para o céu, é o nosso caminho que começa o céu daqui (...) Porque temos esta identidade cristã, temos o selo do Espírito Santo".

Francisco convidou os fiéis a pedirem a nosso Senhor a "graça de ficar sempre atentos a este selo, a esta nossa identidade cristã, que não é só prometida, mas que já temos na mão como fiança".

Quem passa fome são pessoas e não números

Em carta ao diretor geral da FAO, o Santo Padre pede que as reflexões deem espaço para iniciativas concretas
Por Rocio Lancho García
CIDADE DO VATICANO, 17 de Outubro de 2014 (Zenit.org) - 
Por ocasião da Jornada Mundial da Alimentação, celebrada ontem, o papa Francisco observou que "apesar dos avanços em muitos países, os últimos dados continuam apresentando uma situação inquietante, agravada pela diminuição geral das ajudas públicas ao desenvolvimento". O papa se manifestou em carta enviada ao brasileiro José Graziano da Silva, diretor geral da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura).
Esta Jornada, afirma o papa, "ecoa o grito de tantos irmãos e irmãs nossos que, em diversas partes do mundo, não têm o pão de cada dia". A data também "nos faz pensar na enorme quantidade de alimentos desperdiçados, nos produtos que são destruídos, na especulação com os preços em nome do deus lucro".
Segundo o papa, este é "um dos paradoxos mais dramáticas do nosso tempo, ao qual assistimos com impotência e, frequentemente, também com indiferença". Mas Francisco olha para além dos dados, indicando que "há um aspecto importante do problema que ainda não recebeu a devida consideração nas políticas e nos planejamentos de ação: quem sofre a insegurança alimentar e a desnutrição são pessoas e não números, e, precisamente por causa da sua dignidade como pessoas, elas estão acima de qualquer cálculo ou projeto econômico".
Por outro lado, o Santo Padre observa que o tema proposto pela FAO para esta Jornada (Agricultura familiar: alimentar o mundo, cuidar do planeta) enfatiza a necessidade de se partir das pessoas, como indivíduos ou como grupos, na hora de se proporem novas formas e modos de gestão dos vários aspectos da alimentação.
Em particular, o pontífice indica que "é necessário reconhecer cada vez mais o papel da família rural e desenvolver todas as suas potencialidades".  Ele faz um convite, assim, a se prestar mais atenção às necessidades da família rural, "não só [as necessidades] técnicas, mas também humanas, espirituais, sociais". E complementa: "Temos que aprender da experiência delas, da sua capacidade de trabalho e, acima de tudo, desse vínculo de amor, de solidariedade e de generosidade que existe entre os seus membros e que é chamado a ser modelo para a vida social".
A carta do papa também afirma que a família "favorece o diálogo entre as diversas gerações e planta as bases para uma verdadeira integração social, além de representar essa desejada sinergia entre trabalho agrícola e sustentabilidade". É bom falar da família rural e celebrar anos internacionais para recordá-la, mas não é suficiente: "essas reflexões têm que abrir passagem para iniciativas concretas".
Em um segundo ponto, Francisco afirma que "defender as comunidades rurais diante das graves ameaças da ação humana e dos desastres naturais não deveria ser só uma estratégia, mas uma ação permanente que favoreça a sua participação na tomada de decisões, que coloque ao seu alcance tecnologias apropriadas e estenda o seu uso, respeitando sempre o meio ambiente". Nunca como agora o mundo precisou tanto que as pessoas e as nações se unam para superar as divisões e os conflitos existentes.
Por esta razão, Francisco exorta à partilha e à solidariedade, uma obrigação que não pode se limitar à distribuição de alimentos. "Compartilhar quer dizer tornar-se próximo de todos os homens, reconhecer a comum dignidade, estar atentos às suas necessidades e ajudá-los a remediá-las, com o mesmo espírito de amor que se vive numa família", afirma o papa.
No terceiro ponto da sua reflexão, o Santo Padre reconhece que, para vencer a fome, é necessário "mudar o paradigma das políticas de ajuda e de desenvolvimento, modificar as regras internacionais em matéria de produção e comercialização dos produtos agrícolas, garantindo a autodeterminação do mercado agrícola nos países em que a agricultura representa a base da economia e da sobrevivência".
Chegou a hora, diz Francisco, de pensar e decidir com base em cada pessoa e comunidade, e não a partir da situação dos mercados.

Ao terminar, o bispo de Roma explica que a Igreja católica "está disposta a oferecer, iluminar e acompanhar tanto a elaboração de políticas como a sua colocação em prática, consciente de que a fé se torna visível ao se realizar o projeto de Deus para a família humana e para o mundo, mediante uma profunda e real fraternidade que não é exclusiva dos cristãos, mas que inclui todos os povos".

São Lucas







Um escrito do século II, que estudos recentes consideram historicamente verídico, sintetiza do seguinte modo o perfil deste santo evangelista: “Lucas, um sírio de Antioquia, médico de profissão, discípulo dos apóstolos, mais tarde seguiu são Paulo até a confissão (martírio) deste. Serviu irrepreensivelmente ao Senhor, jamais tomou mulher, nem teve filhos. Morreu aos 84 anos, na Boécia, cheio do Espírito Santo”.


Das notas de viagem, isto é, dos Atos dos Apóstolos, no qual Lucas fala na primeira pessoa, apreendemos todas as notícias que a ele dizem respeito, além de breves acenos nas cartas de são Paulo — o apóstolo ao qual, mais do que a qualquer outro, estava ligado por fraterna amizade. 

“Saúda-vos Lucas, médico amado”, lê-se na Carta aos Colossenses. A profissão de médico pressupõe uma boa cultura. Realmente, em seus escritos se revela um homem culto, com inclinações artísticas e bons dotes literários. Com são Paulo realizou a segunda viagem missionária de Trôade a Filipos, por volta do ano 50. Em Filipos deteve-se um par de anos para consolidar o trabalho do Apóstolo, após o qual voltou a Jerusalém. 

Foi de novo companheiro de viagem de são Paulo e compartilhou com ele a prisão em Roma.
Os cristãos orientais atribuem ao “médico pintor”, Lucas, numerosos quadros representando a Virgem. Em seu evangelho, escrito em um grego fluente e límpido, Lucas traça a biografia da Virgem e fala da infância de Jesus. Revela-nos os íntimos segredos da Anunciação, da Visitação e do Natal, fazendo-nos entender que conheceu pessoalmente a Virgem, a ponto de alguns exegetas considerarem que tenha sido Maria quem lhe transcreveu o Magnificat. É Lucas mesmo quem afirma ter feito pesquisas e pedido informações sobre fatos relativos à vida de Jesus junto àqueles que deles foram testemunhas. Só Maria podia ser testemunha da Anunciação e dos fatos que se seguiram.

Lucas conhecia os evangelhos de Mateus e Marcos quando começou a escrever o seu, antes do ano 70. Julgava que ao primeiro faltava uma certa ordem no desenvolvimento dos fatos e considerava o segundo por demais conciso.

Como diligente estudioso, Lucas, depois de ter documentado escrupulosamente as notícias da vida de Jesus “desde o início”, quis narrá-la novamente de forma ordenada, de modo que os fatos e ensinamentos progredissem pari passu como a realidade. 

Deu prova da mesma agradável fluência narrativa também na redação dos Atos dos Apóstolos.
Três cidades se ufanam de conservar suas relíquias: Constantinopla, Pádua e Veneza.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Esperança cristã não é simples otimismo


Por Redacao
CIDADE DO VATICANO, 15 de Outubro de 2014 (Zenit.org) - Na Audiência Geral desta quarta-feira, o Papa Francisco deu continuidade ao ciclo de catequeses sobre a Igreja. Eis o texto na íntegra:
Queridos irmãos e irmãs, bom dia.
Durante este tempo falamos da Igreja, da nossa santa mãe Igreja hierárquica, o povo de Deus em caminho. Hoje queremos nos perguntar: no fim, o que será do povo de Deus? O que será de cada um de nós? O que devemos esperar? O apóstolo Paulo encorajava os cristãos da comunidade de Tessalônica, que se colocam estas perguntas, e depois de sua argumentação diziam estas palavras que estão entre as mais belas do Novo Testamento: “E assim para sempre estaremos com o Senhor!” (1 Ts 4, 17). São palavras simples, mas com uma densidade de esperança tão grande! É emblemático como, no livro do Apocalipse, João, retomando a intuição dos Profetas, descreve a dimensão última, definitiva, nos termos da “nova Jerusalém, que desce do céu, de Deus, pronta como uma esposa ornada para seu esposo” (Ap 21, 2). Eis o que nos espera! E então quem é a Igreja: é o povo de Deus que segue o Senhor Jesus e que se prepara dia após dia ao encontro com Ele, como uma esposa com o seu esposo. E não é só um modo de dizer: serão as verdadeiras e próprias núpcias! Sim, porque Cristo, fazendo-se homem como nós e fazendo de todos nós uma só coisa com Ele, com a sua morte e a sua ressurreição, esposou-se conosco e fez de nós como povo a sua esposa. E isto não é outra coisa que não o cumprimento do desígnio de comunhão e de amor tecido por Deus no curso de toda a história, a história do povo de Deus e também a história própria de cada um de nós. É o Senhor que leva isso adiante.
Há um outro elemento, porém, que nos conforta mais e que nos abre o coração: João nos diz que na Igreja, esposa de Cristo, torna-se visível a “nova Jerusalém”. Isto significa que a Igreja, além de esposa, é chamada a se tornar cidade, símbolo por excelência da convivência e do relacionamento humano. Que belo, então, poder já contemplar, segundo outra imagem sugestiva do Apocalipse, todos as pessoas e todos os povos reunidos juntos nesta cidade, como em uma tenda, “a tenda de Deus” (cfr Ap 21, 3)”! E nesta situação gloriosa não haverá mais isolamentos, prevaricações e distinções de gênero algum– de natureza social, étnica ou religiosa – mas seremos todos uma só coisa em Cristo.
Diante desse cenário inaudito e maravilhoso, o nosso coração não pode não se sentir confirmado de modo forte na esperança. Vejam, a esperança cristã não é simplesmente um desejo, não é otimismo: para um cristão, a esperança é espera, espera fervorosa, apaixonada pelo cumprimento último e definitivo de um mistério, o mistério do amor de Deus, no qual renascemos e já vivemos. E é espera por alguém que está para chegar: é o Cristo Senhor que se faz sempre mais próximo a nós, dia após dia, e quem vem para nos introduzir finalmente na plenitude da sua comunhão e da sua paz. A Igreja tem, então, a tarefa de manter acesa e bem visível a lâmpada da esperança, para que possa continuar a resplender como sinal seguro de salvação e possa iluminar toda humanidade no caminho que leva ao encontro com a face misericordiosa de Deus.
Queridos irmãos e irmãs, eis então o que esperamos: que Jesus volte! A Igreja esposa espera o seu esposo! Devemos nos perguntar, porém, com muita sinceridade: somos realmente testemunhas luminosas e credíveis desta espera, desta esperança? As nossas comunidades vivem ainda no sinal da presença do Senhor Jesus e na espera calorosa da sua vinda, ou parecem cansadas, entorpecidas, sob o peso do cansaço e da resignação? Corremos também nós o risco de exaurir o óleo da fé e o óleo da alegria? Estejamos atentos!

Invoquemos a Virgem Maria, mãe da esperança e rainha do céu, para que nos mantenha sempre em uma atitude de escuta e de espera, de forma a poder estar já agora permeados pelo amor de Cristo e participar um dia da alegria sem fim, na plena comunhão de Deus e não se esqueçam, nunca esquecer: “E assim para sempre estaremos com o Senhor!” (1 Ts 4, 17).

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

O ser humano, dotado de razão e inteligência

  

Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba (MG)

Dizemos que o ser humano é um dos seres vivos do planeta dotado de razão e inteligência, capaz para decidir entre o bem e o mal e direcionar sua vida para o futuro. Num contexto de fé, ele tem uma história iluminada por Deus e projetada dentro de um caminho de salvação. Com isto, é humano com finalidade divina e sua vontade deve estar sempre subordinada à de Deus.

Sendo Deus o Senhor da história, os atos do homem e os (atos) humanos devem estar subordinados aos critérios das palavras da fé. O ser humano tem primazia entre todas as criaturas, mas não é dono do mundo. Há limites definidos de responsabilidade e de respeito para com o alheio. O que realizamos fora desses parâmetros, chamamos de violência e de desrespeito.
Na via da história da sociedade temos a autoridade política, que cuida da ordem e do bem público, e que deve ser respeitada dentro de seu campo. Mas também o poder público tem seus limites e estão subordinados aos princípios da Palavra de Deus. Essas autoridades não podem exigir o que só a Deus é devido.
Por constituição básica, o ser humano está sujeito a duas forças de poder, uma política e outra religiosa. Por força da origem, ele é político, em vista do bem comum, e religioso como inspiração natural de seu ser e destino divinos. Jesus harmoniza essas duas realidades com a expressão: “Dai, pois a Cézar o que é de Cézar e a Deus o que é de Deus” (Mt 22,21).
A autoridade deve saber que ela é instrumento de Deus para executar uma tarefa. Elegemos Presidente da República para que ele serva o país, administre o bem público de forma correta, tendo como meta principal a dignidade do ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus.

Nenhuma autoridade é eterna e absoluta. Se o povo a elege, deveria também destitui-la no caso de improbidade administrativa. Isto significa exercer seu direito de cidadania e fazer a vontade de Deus no cumprimento da justiça.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Família, Igreja e sociedade







Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo (SP)

No Vaticano, o Sínodo dos Bispos realiza sua 3ª assembleia extraordinária, tendo como tema os atuais desafios da família, que interpelam a ação da Igreja. De 5 a 19 de outubro, os 253 participantes, convocados pelo papa Francisco, relatam sobre os desafios familiares de maior relevância nos âmbitos das 114 Conferências Episcopais representadas; participantes de vários organismos da Igreja falam da sua percepção das questões atinentes à família; delegados de outras Igrejas cristãs também presentes.

Além deles, vários casais dos 5 Continentes falam das experiências vividas no casamento e na vida familiar; 38 observadores não-bispos acompanham o desenvolvimento dos trabalhos e 16 especialistas oferecem sua ajuda nas diversas áreas de estudos e ação profissional interessadas nas temáticas familiares. O Papa assiste a tudo, ouve, observa e, no final, recebe indicações da assembleia para as decisões que achar oportunas.
Francisco quis que esta assembleia extraordinária examinasse de maneira mais específica os desafios atuais da família. Hoje há uma percepção compartilhada de que o casamento e a família atravessam uma crise sem precedentes, não apenas nos povos de cultura ocidental, mas também em regiões, onde ainda havia, até recentemente, uma forte cultura favorável à família, como na América Latina e na África.
A crise manifesta-se no elevado número de divórcios e casamentos desfeitos e de casais que convivem sem nenhuma formalização do casamento, nem civil, nem religiosa; impressiona a quantidade dos que rejeitam toda forma de união, vivendo como “singles”. E isso é comum a países da Europa, América e Ásia. Na África, a tendência é a mesma. Além disso, a natalidade caiu de modo significativo na maioria dos países;  nota-se também uma perda de espaço e de relevância social crescente da família.
São notáveis os dramas e as dificuldades enfrentadas pelas famílias nas áreas de guerra e conflitos, de discriminação cultural e religiosa. Um fluxo migratório constante da África, América Latina e Ásia leva as vítimas da pobreza e da violência a tentarem vida melhor em países mais prósperos; nesses casos, as famílias geralmente são dilaceradas e se sujeitam a toda sorte de precariedades e incertezas. Drama muito especial vivem famílias de grupos étnicos e religiosos minoritários da Síria e do Iraque, tendo que  abandonar tudo e fugir para não serem vítimas do grupo fanático que lhes impõe abraçar à força uma fé, que não é a sua, ou morrer. Há também países pobres submetidos a enormes pressões de organizações internacionais para adotarem políticas drásticas de redução da natalidade e de mudança de sua cultura familiar. Há, enfim, um vergonhoso tráfico de pessoas para a exploração sexual, submetidas a regimes degradantes de escravidão.
Também nos países livres e pluralistas, famílias são submetidas a pressões desagregadoras pela sociedade de consumo, o mercado de trabalho, as condições econômicas e sociais sufocantes, que não lhes deixam espaço nem energia para o cultivo da vida familiar minimamente satisfatória. Como pode zelar bem de si uma das muitas famílias das periferias metropolitanas, se os pais precisam sair muito cedo para chegar em tempo no lugar de trabalho e, à noite, chegam em casa mortos de cansados, mal havendo tempo e disposição para trocar algumas palavras ou dar atenção aos filhos? Nessas condições, qual esperança têm os jovens para sonharem com um casamento e uma família feliz?
Não são poucos os dramas e as pressões vividas pelas famílias! Em vários países, entre os quais o Brasil, boa parte das crianças não nasce em famílias constituídas; suas mães, com frequência bem jovens e sem nenhuma segurança social e econômica, vivem a maternidade de maneira heroica e merecem todo respeito e admiração. Porém, essa não é, certamente, a condição ideal para que uma criança venha ao mundo e tenha garantias de um futuro bom.
A preocupação da Igreja com a família, com frequência, é vista como interesse confessional e a partir de questões pontuais: se o divórcio é permitido, se o aborto é aceitável, se os contraceptivos podem ser usados, se os filhos nascidos fora do casamento podem ser batizados, se há casamento entre pessoas do mesmo sexo... Todas essas questões, de fato, merecem a atenção da Igreja. Mas a questão da família é mais profunda e profunda: o Sínodo convocado pela Papa Francisco expressa as suas perplexidades sobre a realidade familiar, enquanto tal. Como será essa família no futuro e quais serão as suas atribuições? Ela ainda será capaz de desempenhar as suas funções em relação à pessoa, à comunidade humana e à própria comunidade religiosa?
A Igreja procura ir ao encontro dos desafios vividos pela família hodierna, socorrendo, amparando, encorajando; a partir de suas convicções de fé em Deus, ela convida as pessoas a conformarem a vida com o Evangelho do reino de Deus. Mas a questão não interessa apenas à Igreja e à religião. De fato, à família está relacionado intimamente o bem da vida social, cultural, econômica e política. A família interessa ao bem da pessoa e da sociedade inteira.
Coloca-se, portanto, a pergunta sobre a atenção que a família recebe da política e dos governantes? Ela não pode ser abandonada a si mesma, ou ao âmbito da vida privada. Por certo, ela está nesse âmbito e representa um espaço fundamental de privacidade e liberdade, não devendo o Estado interferir nela indevidamente. Ao mesmo tempo, porém, o Estado deveria proteger a família e dar-lhe condições para o bom desempenho do seu papel. Se o fizer, sairá ganhando a sociedade e os próprio Estado. Deixando a família no abandono, o Estado e a sociedade colherão muitos problemas.