terça-feira, 5 de agosto de 2014

A construção da paz


Dom Murilo S.R. Krieger

Arcebispo de Salvador (BA)
O mundo assiste, estarrecido, a guerra no Oriente entre judeus e palestinos. De um lado, é constante o lançamento indiscriminado de foguetes por parte do Hamas e de outros grupos militantes palestinos contra Israel; de outro, é contínuo o bombardeio dos israelenses contra áreas palestinas, inclusive a centros civis, com mortes de centenas de crianças e de inúmeros cidadãos indefesos. Impotentes, parece que a única resposta que nos resta é a de procurar saber, à noite, numa conta macabra, qual o número de mortos naquele dia. É incrível, mas ainda não aprendemos as lições que nos deram nossos antepassados, que viveram guerras terríveis, nas quais morreram milhões de pessoas. Como é possível que estejamos repetindo os mesmos erros que eles cometeram? Como é que ainda não descobrimos os caminhos que nos levam à paz? Melhor: como construiremos alicerces sólidos e duradouros para a edificação da paz?
A História nos ensina que qualquer guerra é fruto da violação sistemática dos direitos humanos, e ela própria se torna causa de novas e mais graves violações. Além disso, sempre que nossos interesses particulares são colocados acima do bem comum, multiplicam-se as sementes da instabilidade, da revolta e da violência.
A dignidade da pessoa humana tem seu fundamento numa certeza: fomos criados à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1,26-28). Compreende-se, pois, porque o nosso olhar deve estar orientado para Ele e para aqueles que, como nós, estão revestidos da dignidade humana. Os direitos humanos não foram conferidos por alguma instituição ou legislação; são apenas reconhecidos por elas. Como são inerentes a cada pessoa, ninguém pode ser privado deles. Isso seria uma violação de sua natureza.
Ao longo da História, toda vez que se esqueceu da verdade do ser humano, nasceram respostas que não resolveram os problemas encontrados e deram origem a novos, muitas vezes piores que os anteriores. Como esquecer – só para lembrar exemplos de um passado recente – o que nos trouxeram o nazismo, o fascismo e o marxismo? E o que dizer do consumismo atual, que coloca como objetivo último da vida a exaltação do indivíduo e a satisfação egocêntrica das aspirações pessoais?
O primeiro de todos os direitos é o direito à vida. Como a vida humana é sagrada, é preciso ter sempre presente o mandamento: "Não matarás!" Mas é também necessária uma atitude positiva frente à vida. Uma verdadeira cultura da vida tanto protege o direito de vir ao mundo a quem ainda não nasceu, como defende os recém-nascidos, os inválidos, os doentes e os idosos. Optar pela vida implica a rejeição de todas as formas de violência: a violência da pobreza e da fome; a dos conflitos armados; a da difusão das drogas e do tráfico de armas; a dos danos causados ao ambiente natural.
No coração dos direitos humanos está a liberdade religiosa. Ninguém pode ser obrigado a aceitar à força uma determinada religião. Cada pessoa tem direito de manifestar as próprias crenças. No entanto, há nações – Iraque e Síria, por exemplo - onde indivíduos, famílias e grupos são discriminados, marginalizados, perseguidos e expulsos por causa de sua fé cristã.
Cada cidadão tem o direito de participar na vida da própria comunidade, tomando parte nas decisões que lhe dizem respeito. Assim é que se constrói um sistema democrático. Esse direito ainda não foi reconhecido em todos os países. Mas também cada país tem o dever de respeitar os demais países. E, se houver discordâncias entre ambos, por que não buscar o diálogo? De que adianta uma ONU se voltamos a acreditar na força do tacape e no valor das bombas?...
A construção da paz exige de nós redobrados esforços e muita criatividade, ainda mais que a humanidade não a encontrará sem respeitar os direitos humanos. Sirvam-nos de incentivo na luta pela defesa desses direitos e, portanto, na conquista da paz, as palavras de Jesus Cristo: "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus!" (Mt 5,9).

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