A Pacem in terris é o legado do Papa João XXIII a uma humanidade desejosa de paz. O título recorda o hino cantado pelos anjos no nascimento de Jesus: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados» (Lc 2, 14). E precisamente como o cântico angélico limita a experiência da paz na terra aos homens através do genitivo limitativo «por ele amados», assim o Papa João XXIII invoca a «paz na terra, anseio profundo dos seres humanos de todos os tempos», subordinando-a ao «pleno respeito da ordem estabelecida por Deus». E é a exposição desta ordem estabelecida por
Deus que manteve João XXIII ocupado na encíclica. De facto, não obstante a crise missilística em Cuba e a ameaça de um conflito nuclear tenham sido a ocasião mais imediata para a sua promulgação, a encíclica não aconselha diretamente o desarmamento nuclear ou a abolição da guerra.
O tema da Pacem in terris não leva à paz partindo da guerra, mas da dignidade humana e das relações.
As relações não são algo em que nos encontramos por acaso, e a dignidade não é algo que podemos ter ou não. Relações e dignidade são o que somos porque somos seres humanos, nada e ninguém no céu ou na terra é constituído assim. Por isso «são o fundamento da legitimidade moral de cada autoridade» local, nacional ou internacional. A dignidade e os direitos das pessoas precedem a sociedade, e ela deve reconhecê-los, respeitá-los, protegê-los e promovê-los como tais.
A encíclica, na época da guerra fria, teve também o carácter de um vademecum para a construção da paz. É um manual da doutrina social da Igreja sobre o compromisso em política, baseado em requisitos fundamentais da coexistência humana: o respeito dos direitos que brotam da dignidade de cada pessoa, e a vocação de viver num relacionamento pelo bem-estar de todos e, por último, pelo bem comum. Uma educação completa e digna do nome católica inclui três dinâmicas entrelaçadas: inteireza, contextualização e colaboração.
Todos os pontífices da época moderna, de formas diferentes, encorajaram os católicos a assumir o próprio papel na política, a abraçar a vocação à política como uma das formas mais elevadas de caridade. Bento XVI evocou várias vezes a formação de católicos «capazes de assumir responsabilidades directas nos vários âmbitos sociais, de modo particular no político». Também o Papa Francisco exortou os fiéis a interessarem-se pela política e a participarem nela de modo concreto.
Além disso, o Papa Francisco tratou de maneira nova os elementos seculares da cultura que se está a globalizar. É a esta praça pública tumultuosa – o único mercado do mundo que se torna cada vez mais global pela internet – que os católicos devem ser enviados em missão como políticos bem preparados, empregados públicos, opinionistas e participantes nos grandes debates do nosso tempo.
Peter Kodwo Appiah Turkson
via internet
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