Por Dom Alberto Taveira Corrêa
- Houve um homem que deixou uma grande
descendência, comparada com as areias do mar ou as estrelas do céu. Seu nome,
Abraão (Cf. Gn 12,1-4), está ligado às grandes religiões monoteístas, o
judaísmo, o islamismo e o cristianismo. Um nômade chamado a deixar a própria
terra, convocado a apostar numa promessa de paternidade, quando os anos lhe eram
passados. Arriscou sua vida na visão do invisível, por ter conhecido a
experiência magnífica da fé. Até seus afetos foram tocados, inclusive
endurecidos, quando esteve disposto a sacrificar o fruto da promessa. É que
alguém passava na frente de todas as suas seguranças. Ele é chamado pai da fé,
para a imensa multidão que se espalha pelos rios da terra e da história!
No rastro deixado por Abraão, homens e mulheres caminharam atrás do
invisível, enfrentaram obstáculos intransponíveis, viveram de esperança em
esperança. Aquele em que acreditavam suscitou-lhes profetas, pessoas teimosas
que entreviam luz onde tudo parecia treva, gente que arregimentava multidões,
capazes de atravessar desertos durante quarenta anos, ou sofrer o exílio, a
perseguição e a incompreensão. Muito mais tarde, depois de apanhar de tudo e de
todos, cresce um resto pequeno e fiel, aqueles que foram chamados pobres de
Javé. Com eles a chama permaneceu acesa. E veio Jesus, Verbo de Deus feito
carne, para tornar visível e presente o amor de Deus, que amou seriamente o
mundo!
Os que tiveram primeiro o prazer de conhecê-lo formaram um grupo, chamados de
discípulos. Quem foram eles? Pescadores e pecadores, funcionários, comerciantes,
publicanos, doentes que jaziam à beira da estrada, pobres e ricos, gente bonita
e gente feia. Deus tem um gosto diferente! É que Ele vê lá dentro, sabe
descobrir uma chama frágil dentro do coração das pessoas. E o faz mais do que
qualquer outro. Por isso, muitos querem ter o prazer de conhecê-lo.
Os primeiros discípulos tiveram surpresas ao se decidirem a seguir Jesus.
Para muitas pessoas, a expectativa era de um Messias poderoso, cheio de poder e
autoridade, disposto a enfrentar os poderes opressores, corajoso diante das
ameaças. As conversas correntes aprontavam para um líder glorioso, e se
apresenta um homem que percorre as estradas da Palestina, anunciando um Reino
que é de Deus, propondo uma vida diferente, curando as pessoas, a espalhar o
perdão, erguendo os braços e pernas vacilantes. Muito prazer tiveram ao
conhecê-lo, ainda que os deixasse implicados com a novidade.
Uma das realidades humanas cultivadas por Jesus foi a amizade. Três de seus
discípulos o acompanharam em ocasiões especiais. O primeiro, Pedro, homem da
generosidade, da sinceridade, da insegurança e da negação. Depois os dois
“Filhos do Trovão – Boanerges”, cujo apelido não deve ter significado muita
coisa boa. Um deles, pela proximidade com Jesus, João, fez com que até hoje
valorizemos quem é “amigo do peito”. Os três acompanharam Jesus quando foi à
Casa de Jairo, estiveram com Ele (dormindo!) durante as horas de agonia no Horto
das Oliveiras e foram reconhecidos como colunas da Igreja nos tempos
apostólicos. Sempre próximos de Jesus, nas intervenções oportunas ou não, mas
amigos, daquele tipo de amizade sincera que dizemos ser um santo remédio! E foi
diante deles que Jesus quis apresentar-se com o que havia de mais bonito, quando
os conduziu ao monte que a tradição reconheceu ser o Tabor.
Ao se apresentar diante deles, Jesus teve o cuidado de assegurar-lhes, num
respeito profundo às tradições em que tinham sido criados, testemunhas
qualificadas, Moisés e Elias, a Lei e os Profetas. Como se não bastasse, é na
nuvem da presença divina que são envolvidos e a voz do Pai se manifesta, para
proclamar que nele estava todo o seu agrado. Por isso, era para escutá-lo.
Prazer em conhecer Jesus! A experiência dos discípulos se destina a todos
nós.
Conhecer Jesus quer dizer aprender que com a paixão e a cruz se chega à
glória da Ressurreição. Deus não nos engana, mas nos faz realistas, com os pés
no chão, para edificar a fidelidade cotidiana e enfrentar, sem desanimar, todos
os desafios da vida. Discípulo se forma no torno de um cotidiano apertado mesmo,
no qual de aprende a amar e a sair de si.
O prazer em conhecer Jesus leva as pessoas a se interessarem por Ele, pela
força de sua Palavra, cria nelas o empolgamento pelas causas que são suas, como
a verdade, a justiça e a fraternidade. Trabalhar pelo bem dos outros passa a ser
a alegria da vida, e os pesos desaparecem! Ao descer das montanhas em que o
Senhor se revela, ao longo da vida, àqueles que são seus, Ele continua pedindo o
silêncio do testemunho, para que suas vidas suscitem questionamentos e as
pessoas sejam conduzidas a fazerem a mesma experiência. Tanto é verdade que São
Paulo, ecrevendo ao seu amigo Timóteo, não teve receio de dizer-lhe: “Deus não
nos deu um espírito de covardia, mas de força, de amor e de moderação. Portanto,
não te envergonhes de testemunhar a favor de nosso Senhor, nem te envergonhes de
mim, seu prisioneiro; mas, sustentado pela força de Deus, sofre comigo pelo
evangelho. Deus nos salvou e nos chamou com uma vocação santa, não em atenção às
nossas obras, mas por causa do seu plano salvífico e da sua graça, que nos foi
dada no Cristo Jesus” (2 Tm 1,7-9).
O Pedro das várias aventuras com Jesus, que até pediu que dele se afastasse
seu amigo, por sentir-se pecador, o que foi feito pescador de homens em lugar
dos peixes, guardou a memória dos acontecimentos da Transfiguração: “Não foi
seguindo fábulas habilmente inventadas que vos demos a conhecer o poder e a
vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, mas sim, por termos sido testemunhas
oculares da sua grandeza. Efetivamente, ele recebeu honra e glória da parte de
Deus Pai, quando do seio da esplêndida glória se fez ouvir aquela voz que dizia:
‘Este é o meu Filho bem-amado, no qual está o meu agrado’. Esta voz, nós a
ouvimos, vinda do céu, quando estávamos com ele na montanha santa” (2 Pd 1,
16-18). Com Pedro, Tiago e João, descendo da montanha para a planície,
resplandeça em nossas ações a luz daquele que tivemos o prazer de
conhecer!
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